Diana
Meneses Cunha, criadora da Oficina 166 é conhecida pelas suas peças de
tecelagem contemporânea tecidas em ramos naturais. Fizemos-lhe esta entrevista
para ficar a conhecer melhor o seu trabalho.
Diana,
fale-nos um pouco do seu percurso.
Desde
adolescente que gosto de trabalhos manuais. Comecei com o ponto de cruz (sempre com fios da DMC),
passei pelos tapetes de Arraiolos, bijuteria, trabalhos com papel e cartão e
aventurei-me na costura, sempre de uma forma autodidata, consultando livros e
os tutoriais que se encontram na internet. Mesmo depois de começar a trabalhar
na banca, tentei sempre manter-me ocupada e consegui conciliar um hobby com a
carreira profissional e a família.
Em
2009 mudámo-nos para Luanda (Angola) e durante os 6 anos, que lá vivemos, tive
de deixar a minha criatividade de lado. Não só o dia-a-dia em Luanda é
desgastante, como os materiais necessários são escassos, já para não dizer
inexistentes.
No
início de 2015, altura em que completei 41 anos, senti uma necessidade enorme
de abrandar o ritmo de vida e de voltar a desenvolver a minha criatividade. No
fundo, acompanhar a tendência para o “fazer à mão” a que assistimos agora. O
regresso definitivo a Portugal no final do ano passado fez com que fosse
possível voltar a criar.
Como e
quando começou a tecer?
Nas
minhas “viagens” pela internet, principalmente no Pinterest, descobri o weaving
(tecelagem) contemporâneo e as peças lindas que se fazem, nomeadamente
tapeçarias de parede. Foi amor à primeira vista. Comecei a seguir a Maryanne
Moodie (uma reconhecida artista têxtil australiana que vive atualmente em Nova
Iorque) e tive a felicidade de poder frequentar os seus workshops em Nova
Iorque no verão do ano passado, desde o nível iniciante ao nível avançado.
Já
sabia nessa altura que em Portugal era muito difícil encontrar teares para
venda, por isso trouxe comigo o tear (já incluído nos workshops) e um tear
maior, porque percebi logo que iria querer fazer peças maiores. Não larguei o
tear desde então.
Como
surgiu a ideia de tecer em ramos naturais?
Eu já
tinha uma tendência para aproveitar ramos encontrados na rua. Tenho no quarto
da minha filha um ramo enorme, que parece uma árvore e que encontrei na rua num
dia de temporal.
As
minhas primeiras experiências de tecelagem foram precisamente em ramos. Estava
em Angola e não tinha tear, logo, inspirando-me em algumas imagens que vi no
Pinterest, fui para a rua em busca de ramos. Claro que eram pequenos (50 cm
máximo).
Já em
Portugal, comecei a tecer em ramos/troncos grandes graças ao responsável pelo
visual merchandising da loja, para a qual fiz especialmente umas peças para a
montra, o Raul Torcato. A ideia inicial era fazer uma tapeçaria de parede
grande, mas depois o Raul desafiou-me a tecer em 7 ramos grandes, que ele
próprio arranjou e tratou. Aceitei de imediato e ainda bem, pois os ramos são
lindos, enormes (cerca de 2 metros) e o resultado foi surpreendente.
Quais
os seus favoritos? Teares ou ramos?
Pergunta
difícil.
Sem
sombra de dúvida que os ramos são peças que se destacam pela sua originalidade,
principalmente pela sua dimensão. Contudo, tecer em tear permite-nos explorar
mais, aplicar melhor todas técnicas e usar todos os tipos de fios.
Os ramos
são, sem exceção, um desafio. O maior é montar a teia e mantê-la no lugar,
devido à sua forma irregular; depois vem a dificuldade em trabalhá-los, pois
não se trata de um tear que fica estável em cima de uma mesa. Num tear nós
tecemos horizontalmente, num ramo fazemo-lo na vertical, ou seja, é como fazer
um desenho de lado.
Pensando
bem, depois de terminados, o meu coração é capaz de bater mais por um ramo do
que por uma peça feita em tear. Mas, claro, tudo depende da peça.
Que
tipos de fios utiliza habitualmente e qual o seu preferido?
Em
cada peça gosto muito de usar fios diferentes, pois essa é uma das formas de
obter várias texturas: lã, algodão, trapilho, ráfia, cordão de algodão (usado
normalmente no macramé), etc.
Utilizo
maioritariamente lã. Gosto muito da lã de Arraiolos (tem imensa variedade de
cores) e raramente dispenso lã para feltrar (ou penteada), pois parece algodão
e pode ser tingida de várias cores. É capaz de ser a lã que mais sucesso faz
pela textura.
Nos
ramos é normal tecer com fios mais grossos (a teia fica normalmente mais
espaçada do que num tear) e por isso utilizo mais lã. Nas peças de tear,
aproveito para usar os fios mais finos.
Ainda
não experimentei linho e seda e está nos meus planos fazê-lo em breve.
Quais os fios DMC
que já experimentou nos seus trabalhos? Qual o seu preferido?
Gosto muito do
Woolly (100% lã merino) e adoro os Natura e Natura XL (100% algodão). Para além
da sua textura, as cores disponíveis são lindas. Usei-os na tapeçaria grande
“Matilde” nos tons rosa/salmão, azul e verde água.
Desenha
os seus próprios modelos? Como é o seu processo de trabalho?
Nunca
desenho antes. Fi-lo uma única vez e saiu uma coisa tão diferente que, a partir
desse momento, percebi que não valia a pena. A minha criatividade funciona
muito melhor no tear do que no papel.
As
únicas coisas que preciso de decidir antes de começar cada peça é o tamanho
(para escolher que tear usar) e as cores. Depois vou buscar todas as lãs e fios
das cores escolhidas e espalho-os em cima da mesa (e chão, quando são muitos).
Finalmente, decido se vou começar pela parte de baixo da peça (o mais normal)
ou se começo pelo topo, sendo que neste último caso, o processo é feito “de
pernas para o ar” (é como desenhar um boneco com o papel de pernas para o ar, a
cabeça em baixo e os pés em cima).
E
começo a tecer. Às vezes, durante o processo, perguntam-me como vai ser a peça
e eu não sei. Logo se vê. Raramente me falta inspiração, mas quando acontece, é
hora de parar e ir fazer outra coisa qualquer.
Depois
de terminada, retiro a peça do tear e tiro fotografias para atualizar o site e
as páginas da Oficina 166 nas redes sociais.
Quais
são as suas fontes de inspiração?
Inevitavelmente
a internet. Comecei com o Pinterest, mas estou rendida ao Instagram. Sou capaz
de ter centenas de fotografias de peças feitas por artistas de todo o mundo,
mas o facto é que raramente vou revê-las antes de fazer uma peça.
Sigo
várias artistas, não só as mais conhecidas (como a Maryanne Moodie e a Natalie
Miller) mas também muitas outras. Sigo, por exemplo, uma norte-americana, cujas
peças eu não aprecio, mas que utiliza técnicas diferentes, que resultam nuns
efeitos e texturas pouco comuns.
E
claro que me inspiro no que me rodeia, seja uma paisagem, uma planta, uma peça
de roupa, um arranjo de flores, uma obra de construção, um chão, um prato de
comida...
Quanto
tempo demora a fazer uma peça como esta?
O
facto de ter 3 filhos (os dois rapazes já são adolescentes mas a mais nova tem
3 anos) e de trabalhar a tempo inteiro não me deixa muito tempo para me dedicar
à Oficina. Só me sento à frente do tear ou ramo a partir das 22h e aos
fins-de-semana.
A
tapeçaria de parede “Matilde” mede 1,00 m x 1,30 m. Trabalhei nela cerca de 3
horas por dia, mais ao fim-de-semana. Demorei uma semana e meia. Mas apenas
porque tudo correu de feição. Já tive peças mais pequenas que em proporção
demoraram mais tempo, porque houve dias em que não lhes toquei.
Fale-nos
um pouco da “Oficina 166”.
A
Oficina 166 tem cerca de 4 meses. Quando percebi a recetividade que o meu
trabalho tinha, decidi criar a minha marca e começar a divulgar as minhas peças
já com uma identidade criada.
Porquê
“Oficina 166”? Sempre gostei de fazer coisas à mão e o número da minha porta é
o 166. Apesar de estar agora focada na tecelagem, posso querer explorar também
outras artes e desenvolvê-las em simultâneo. Gosto de inovar e de misturar
técnicas e um exemplo disso é a tapeçaria de parede “Matilde”, que em vez de
franjas tem trabalho de macramé.
Um dos
objetivos da Oficina 166 é ajudar a divulgar a arte da tecelagem contemporânea
e para isso está em curso a organização de workshops. Tenho outras ideias e
iniciativas que gostaria de realizar, mas tudo a seu tempo.
Qual o
seu próximo projeto?
Uma
tapeçaria de parede (em tear) que me foi encomendada, de tamanho médio e em
tons de preto, cinza e branco.
Obrigada Diana, gostámos muito de conhecer o
seu trabalho.
Aqui pode
ver tudo sobre a Oficina 166.
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