segunda-feira, 11 de abril de 2016

Entrevista a Diana Meneses Cunha da Oficina 166

Diana Meneses Cunha, criadora da Oficina 166 é conhecida pelas suas peças de tecelagem contemporânea tecidas em ramos naturais. Fizemos-lhe esta entrevista para ficar a conhecer melhor o seu trabalho.


Diana, fale-nos um pouco do seu percurso.

Desde adolescente que gosto de trabalhos manuais. Comecei com o ponto de cruz (sempre com fios da DMC), passei pelos tapetes de Arraiolos, bijuteria, trabalhos com papel e cartão e aventurei-me na costura, sempre de uma forma autodidata, consultando livros e os tutoriais que se encontram na internet. Mesmo depois de começar a trabalhar na banca, tentei sempre manter-me ocupada e consegui conciliar um hobby com a carreira profissional e a família.  
Em 2009 mudámo-nos para Luanda (Angola) e durante os 6 anos, que lá vivemos, tive de deixar a minha criatividade de lado. Não só o dia-a-dia em Luanda é desgastante, como os materiais necessários são escassos, já para não dizer inexistentes.
No início de 2015, altura em que completei 41 anos, senti uma necessidade enorme de abrandar o ritmo de vida e de voltar a desenvolver a minha criatividade. No fundo, acompanhar a tendência para o “fazer à mão” a que assistimos agora. O regresso definitivo a Portugal no final do ano passado fez com que fosse possível voltar a criar.


Como e quando começou a tecer?

Nas minhas “viagens” pela internet, principalmente no Pinterest, descobri o weaving (tecelagem) contemporâneo e as peças lindas que se fazem, nomeadamente tapeçarias de parede. Foi amor à primeira vista. Comecei a seguir a Maryanne Moodie (uma reconhecida artista têxtil australiana que vive atualmente em Nova Iorque) e tive a felicidade de poder frequentar os seus workshops em Nova Iorque no verão do ano passado, desde o nível iniciante ao nível avançado.
Já sabia nessa altura que em Portugal era muito difícil encontrar teares para venda, por isso trouxe comigo o tear (já incluído nos workshops) e um tear maior, porque percebi logo que iria querer fazer peças maiores. Não larguei o tear desde então.


Como surgiu a ideia de tecer em ramos naturais?

Eu já tinha uma tendência para aproveitar ramos encontrados na rua. Tenho no quarto da minha filha um ramo enorme, que parece uma árvore e que encontrei na rua num dia de temporal.
As minhas primeiras experiências de tecelagem foram precisamente em ramos. Estava em Angola e não tinha tear, logo, inspirando-me em algumas imagens que vi no Pinterest, fui para a rua em busca de ramos. Claro que eram pequenos (50 cm máximo).
Já em Portugal, comecei a tecer em ramos/troncos grandes graças ao responsável pelo visual merchandising da loja, para a qual fiz especialmente umas peças para a montra, o Raul Torcato. A ideia inicial era fazer uma tapeçaria de parede grande, mas depois o Raul desafiou-me a tecer em 7 ramos grandes, que ele próprio arranjou e tratou. Aceitei de imediato e ainda bem, pois os ramos são lindos, enormes (cerca de 2 metros) e o resultado foi surpreendente.



Quais os seus favoritos? Teares ou ramos?

Pergunta difícil.
Sem sombra de dúvida que os ramos são peças que se destacam pela sua originalidade, principalmente pela sua dimensão. Contudo, tecer em tear permite-nos explorar mais, aplicar melhor todas técnicas e usar todos os tipos de fios.
Os ramos são, sem exceção, um desafio. O maior é montar a teia e mantê-la no lugar, devido à sua forma irregular; depois vem a dificuldade em trabalhá-los, pois não se trata de um tear que fica estável em cima de uma mesa. Num tear nós tecemos horizontalmente, num ramo fazemo-lo na vertical, ou seja, é como fazer um desenho de lado.
Pensando bem, depois de terminados, o meu coração é capaz de bater mais por um ramo do que por uma peça feita em tear. Mas, claro, tudo depende da peça.


Que tipos de fios utiliza habitualmente e qual o seu preferido?

Em cada peça gosto muito de usar fios diferentes, pois essa é uma das formas de obter várias texturas: lã, algodão, trapilho, ráfia, cordão de algodão (usado normalmente no macramé), etc.
Utilizo maioritariamente lã. Gosto muito da lã de Arraiolos (tem imensa variedade de cores) e raramente dispenso lã para feltrar (ou penteada), pois parece algodão e pode ser tingida de várias cores. É capaz de ser a lã que mais sucesso faz pela textura.
Nos ramos é normal tecer com fios mais grossos (a teia fica normalmente mais espaçada do que num tear) e por isso utilizo mais lã. Nas peças de tear, aproveito para usar os fios mais finos.  
Ainda não experimentei linho e seda e está nos meus planos fazê-lo em breve.

Quais os fios DMC que já experimentou nos seus trabalhos? Qual o seu preferido?

Gosto muito do Woolly (100% lã merino) e adoro os Natura e Natura XL (100% algodão). Para além da sua textura, as cores disponíveis são lindas. Usei-os na tapeçaria grande “Matilde” nos tons rosa/salmão, azul e verde água.     


Desenha os seus próprios modelos? Como é o seu processo de trabalho?

Nunca desenho antes. Fi-lo uma única vez e saiu uma coisa tão diferente que, a partir desse momento, percebi que não valia a pena. A minha criatividade funciona muito melhor no tear do que no papel.
As únicas coisas que preciso de decidir antes de começar cada peça é o tamanho (para escolher que tear usar) e as cores. Depois vou buscar todas as lãs e fios das cores escolhidas e espalho-os em cima da mesa (e chão, quando são muitos). Finalmente, decido se vou começar pela parte de baixo da peça (o mais normal) ou se começo pelo topo, sendo que neste último caso, o processo é feito “de pernas para o ar” (é como desenhar um boneco com o papel de pernas para o ar, a cabeça em baixo e os pés em cima).
E começo a tecer. Às vezes, durante o processo, perguntam-me como vai ser a peça e eu não sei. Logo se vê. Raramente me falta inspiração, mas quando acontece, é hora de parar e ir fazer outra coisa qualquer.
Depois de terminada, retiro a peça do tear e tiro fotografias para atualizar o site e as páginas da Oficina 166 nas redes sociais.  



Quais são as suas fontes de inspiração?

Inevitavelmente a internet. Comecei com o Pinterest, mas estou rendida ao Instagram. Sou capaz de ter centenas de fotografias de peças feitas por artistas de todo o mundo, mas o facto é que raramente vou revê-las antes de fazer uma peça.
Sigo várias artistas, não só as mais conhecidas (como a Maryanne Moodie e a Natalie Miller) mas também muitas outras. Sigo, por exemplo, uma norte-americana, cujas peças eu não aprecio, mas que utiliza técnicas diferentes, que resultam nuns efeitos e texturas pouco comuns.
E claro que me inspiro no que me rodeia, seja uma paisagem, uma planta, uma peça de roupa, um arranjo de flores, uma obra de construção, um chão, um prato de comida...


Quanto tempo demora a fazer uma peça como esta?

O facto de ter 3 filhos (os dois rapazes já são adolescentes mas a mais nova tem 3 anos) e de trabalhar a tempo inteiro não me deixa muito tempo para me dedicar à Oficina. Só me sento à frente do tear ou ramo a partir das 22h e aos fins-de-semana.
A tapeçaria de parede “Matilde” mede 1,00 m x 1,30 m. Trabalhei nela cerca de 3 horas por dia, mais ao fim-de-semana. Demorei uma semana e meia. Mas apenas porque tudo correu de feição. Já tive peças mais pequenas que em proporção demoraram mais tempo, porque houve dias em que não lhes toquei.
  

Fale-nos um pouco da “Oficina 166”.

A Oficina 166 tem cerca de 4 meses. Quando percebi a recetividade que o meu trabalho tinha, decidi criar a minha marca e começar a divulgar as minhas peças já com uma identidade criada.
Porquê “Oficina 166”? Sempre gostei de fazer coisas à mão e o número da minha porta é o 166. Apesar de estar agora focada na tecelagem, posso querer explorar também outras artes e desenvolvê-las em simultâneo. Gosto de inovar e de misturar técnicas e um exemplo disso é a tapeçaria de parede “Matilde”, que em vez de franjas tem trabalho de macramé.
Um dos objetivos da Oficina 166 é ajudar a divulgar a arte da tecelagem contemporânea e para isso está em curso a organização de workshops. Tenho outras ideias e iniciativas que gostaria de realizar, mas tudo a seu tempo.


Qual o seu próximo projeto?

Uma tapeçaria de parede (em tear) que me foi encomendada, de tamanho médio e em tons de preto, cinza e branco.

Obrigada Diana, gostámos muito de conhecer o seu trabalho.


Aqui pode ver tudo sobre a Oficina 166.

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